terça-feira, 24 de abril de 2012

Mordida!


Eu contemplo a vida e ela empresta-me seus dentes para morder o veludo fosco que é a realidade. Mordo como se eu mordesse a pele de uma dama, de uma moça ou ate mesmo uma senhora. Sei que eu não mordo com gosto de gozo, nem me estranharia se fosse assim, mas era como se ela se banhasse com os mais preciosos perfumes, perfumes estes que me embriagavam, mesmo assim, não deixava de lhe morder.
Porém, nesse ato de morde, de por os dentes em sua carne, já não sei mais o que é realidade e o que é sonho. Tudo se torna tão claro e tão escuro, vivo dicotomias em mim. Mas já não importa, pois continuo a mordê-la com delírios ou não.
Não me contento apenas com as mordidas, a vida quer que eu veja além, assim vou a observar seu corpo. Esse corpo, em que meus dentes prendem, então reparo que ela geme e mais embriagada eu fico. Ela geme pela a dor da minha mordida? Ou a vontade inconsciente que eu vá mordendo seu corpo inteiro? Paro ainda embriagada com seu cheiro e com sua carne inércia entre meus dentes. Não sei mais como agir!
Milhões de pensamentos me invadem agora, e ela olha-me como se implorasse ou sossego ou agito. Mas estou apenas na duvida se seus instintos querem meus instintos?
Observando-a mais um pouco, obtendo a certeza que minhas mãos querem lhe alcançar. Quero que a vida empreste-me mãos, sei que serão fortes e brutas, mas que eu possa tocá-la. E a vida me oferece outra dádiva. Então, minhas mãos, até frias, tocam o corpo quente dessa moça, que agora compreendo que se contorce de desejo e medo. Sinto seu corpo todo tremulo, e meu corpo também treme em seu ritmo, e impressiono-me como o calor do seu corpo passa para minhas mãos. Tudo nosso está quente, até minha boca, que ainda te morde, mudou de temperatura, assim sinto um êxtase incomum, somos uma só!
Ainda com meus dentes presos sem movimento em sua carne, mãos no seu corpo limitando-se a sentir sua temperatura. Busco mais, sempre mais, por isso, vou deslizando a ponta dos meus dedos pelo o corpo dela para poder ouvir novamente seus gemidos que tanto me confundi como me alegra. E para meu descanso e desassossego ela geme e geme, e eu permaneço estátua. São delírios? Permaneço embriagada!
O meu coração agora se enche de angustia e se inquieta para vê-la mais intimamente. Seria uma dádiva grande demais? Seria utopia? 
A vida surpreende-me e me proporciona olhos diferenciados para que eu possa observá-la completa. Ainda com meus dentes na sua pele, meus dedos passeando seu corpo e agora tendo o poder de lhe descobrir me sinto mais viva. Ela para me entorpecer mais, permite-se pra mim, abre-se de infinitas formas para que eu possa lhe ver. E eu vejo seu corpo e é magnífico, e vejo sua alma. Por sorte, ainda permaneço embriagada.
Assusto-me com tamanho frenesi seu, mas não tenho pressa, pois agora lhe vejo e posso te tocar, então deixo de lhe senti com a ponta dos dedos e lhe aperto desse jeito ansioso e imprudente de que somos feitos. Ela não geme mais, ela, apenas, suspira e pede mais mordidas, mais intimidade, mais toques até mais dentes em sua pela que ferve.
Não vou fugir como deveria antes. Agora tudo meu é emprestado e lhe aperto e lhe mordo, penetro ser no ser, e o sangue corre nas veias e sinto as veias pulsar de desejos, desejo esse de cor vermelho escarlate. E lá, muito longe, ouço seus gemidos e suspiros e sons animalescos.
Continuando embriagada flutuei em território distante, e vi seu corpo entregue, descoberto e delirante. Não sabia se te tomava, se te comia, se mordia se lambia, não sabia quiçá se te amava. Eu só exigia da vida que essa realidade fosse minha, que não fosse emprestada.
Por infortúnio meu, o sol veio, e a realidade me trouxe o veludo fosco que eu mordia, não era moça, não era cor escarlate, não estava embriagada, não havia desejo, eu era opaca e cheia de medos e ela fugiu mais rápido que eu pudesse saber se era minha vida ou se era a sua, ou se havia vida em toda essa loucura?
  

Nenhum comentário:

Postar um comentário